História da fundação dos bairros do Bixiga e do Bexiga

Egydio Coelho da Silva

 

 Água e riachos - São Paulo e Bexiga antigos 

Em 1.814, Daniel Pedro Muller construiu uma canalização para abastecer o Jardim da Luz e o Convento da Luz.
Essa canalização partia do Tanque Reúno que ficava nas nascentes do Saracura, afluente do Anhangabaú e atravessava toda a "Cidade Nova" em canalização a céu aberto.

Talvez por ironia se colocou o nome da ponte da Limpeza, que ficava na altura da extinta rua da Assembléia, no trecho em que o rio ficou conhecido pelo nome de Ribeirão da Limpeza, por passar pelo antigo matadouro da Rua Humaitá e porque nele também eram feitos os despejos da antiga cadeia do largo de São Gonçalo, atual Praça João Mendes. 

Nas proximidades da Ponte da Limpeza, no trecho do Riacho Itororó, conhecido como Riacho da Limpeza, que ficava em frente à extinta Rua da Assembléia, existia uma nascente, nela foi construído, em 1744, o primeiro chafariz de São Paulo, por um célebre pedreiro da época, chamado Cipriano Funtam. (40)

A zona onde corria o Anhangabaú de Cima está inteiramente modificada: o Anhangabaú e seus afluentes - Bexiga e Saracura -foram canalizados, desaparecendo, conseqüentemente, suas pontes. Da histórica Bica de Antonio Manuel, na qual se localizou em 1744 o primeiro chafariz de São Paulo, só resta o da Memória.

 O Anhangabaú - também conhecido por Córrego das Almas - deu muito trabalho até sua canalização, registrando a história nele várias enchentes ocasionais. Em 1850, por ocasião de um temporal bastante violento, transbordaram os Tanques Reúno e do Bexiga, cresceram as águas do Anhangabaú, desabaram pontes. Houve inundações, casas destruídas, gente morreu afogada. (40) 

Vários anos antes - em 1837 - o problema havia sido apresentado à Câmara, deliberando-se então que se fizesse um orçamento para limpeza do córrego e aumento de suas margens nos lugares em que estivessem tão estreitas que dificultassem o curso das águas.
Algum tempo depois da enchente grande – isto é, em 1856, a municipalidade teve de mandar desobstruir o Anhangabaú. E em 1862 propunha-se que se mandasse examinar o rio desde a ponte do Piques até a do Miguel Canos, para se ver o melhoramento que poderia ser feito em seu leito, para que por ocasião das grandes enchentes não houvesse inundação dos quintais ribeirinhos. (41)

O ribeirão Anhangabaú foi canalizado em 1906, em quase todo seu trajeto, exceto para o lado das nascentes, no Paraíso. (42)
Nascendo nesse local, desenvolveu-se ele em direção geral de Sul a Norte - escreveu Afonso A. de Freitas - paralelamente às Ruas Vergueiro e Liberdade, cortando as ruas João Julião, Pedroso, Humaitá, Condessa de São Joaquim, Jaceguai, Assembléia, Asdrúbal Nascimento, Largo do Riachuelo (Pça. das Bandeiras). Aí contorna o planalto central da cidade pelas baixadas do Viaduto do Chá, Av. São João, Rua Florêncio de Abreu e final da Vinte e Cinco de Março, desembocando no Tamanduateí.
A sua cava profunda, desde a Rua Paraíso até o Largo do Riachuelo foi perdendo com o tempo sua denominação secular, insensivelmente substituída pela do Vale do Itororó.
(43)
Durante o Século IXX,
nas noites frias e garoentas da Piratininga, as poéticas procissões para "lavar" São João Batista", se dirigiam, precisamente à meia-noite, ao Tanque Reúno ou ao do Matadouro, nas proximidades da hoje rua Humaitá.
À beirada do Tanque ou do Rio — enquanto algumas moças, para saber se a morte lhes ia surgir naquele ano, procuravam ver o rosto na água — delicadas mãos femininas despiam a pequena imagem de São João Batista e a mergulhavam nas águas geladas para o "banho" simbolizador do batismo de Jesus no rio sagrado. Nesse momento os circunstantes cantavam:

São João Batista
Batista João;
Batizou Jesus
Nas águas do Jordão!

 

Águas venenosas

Muito estranho era o Riacho Hiacuba, que corria sob a ponte do mesmo nome, nas proximidades da hoje Praça do Correio.  Nascia na confluência da rua Brigadeiro Tobias com a então ladeira da Santa Efigênia, descia, serpenteando, a para se juntar com as águas do Tanque do Zunega, no Paissandu, e dali desciam ambas a desaguar no velho Anhangabaú.
Suas água eram venenosas. Do seu exame concluíra o engenheiro Sanchez d'Oria, em 1791: "É água ácida e vitriólica, com base calcária de oca e partículas arsenicais, sumamente saturada de gás mefítico".
Embora constatado que as águas eram impróprias para beber, por serem muito ácidas, somente em 1898 a Repartição de Águas e Esgotos as estancou, em seu nascedouro, definitivamente.
 

 

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Referências bibliográficas – desta página  

 

(1)

  FREITAS, Afonso A. de - Plantas História de São Paulo, período de 1800/1.874.

 

(3)

Marzola, Nádia – História dos Bairros de São Paulo, volume 15- Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Cultura – Dezembro de 1.979- página 35

 

(4)

Marzola, Nádia – História dos Bairros de São Paulo, volume 15- Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Cultura – Dezembro de 1.979- página 15

 

Referências bibliográficas - todas

 

1)            Dicionário de História de São Paulo – Antônio Barreto do Amaral – Coleção Paulista; V.19 – 1.980 – Governo do Estado de São Paulo.

2)            Câmara Municipal de São Paulo: 1560-1998: Quatro séculos de história/ Délio Freire dos Santos, José Eduardo Ramos Rodrigues. São Paulo: Imprensa Oficial, 1.998, página 70, páginas 67/68, obra citada de Mawe, John.

3)            Idem, páginas 67, 68,69/70, obra citada de Zaluar, Augusto Emílio.

4)            Idem, página 72, citação a Henrique Raffard, artigo publicado no Diário do Comércio do Rio de Janeiro.

5)            Idem, páginas 70/71

6)            Marzola, Nádia – História dos Bairros de São Paulo, volume 15- Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Cultura – Dezembro de 1.979- página 15

7)            Idem, página 16.

8)            Gilberto Kujawski (artigo no jornal O Estado de S. Paulo 30-05-2.002)

9)            SAIA, Luís - "Fontes primárias para o estudo das habitações das vias de comunicação e dos aglomerados humanos em São Paulo no século XVI", lnst. De Adrninst. da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da USP, pág. 3 e 4.

10)        TAUNAY, Afonso de E. - Non Ducor, Duco, pág. 211

11)        BRUNO, Ernani Silva - Histórias e Tradições de São Paulo, vol. 1, pág. 205

12)        NOGUEIRA, Almeida - Academia de São Paulo, Viii, pág. 128

13)        FREITAS, Afonso A. de - "São Paulo no dia 7 de setembro de 1822", Rev. do lnstit. Hist. e Geog. de São Paulo, XXII, pág. 3

14)        BRUNO, Ernani Silva - op. cit., vol, 1, pág. 96

15)        PRADO, Paulo - Paulística, págs. 8 e 9

16)        BRUNO, Ernani Silva - op. cit., vol, 1, pág. 96

17)        BRUNO, Ernani Silva - op. cit., vol. 1, pág. 91

18)        SAINT-HILAIRE, Auguste de -Viagem à Província de São Paulo, pág. 89

19)        BRUNO, Ernani Silva - op. cit., vol. 1, págs. 93 e 94

20)        BRUNO, Ernani Silva - op. cit., vol. 1, pág. 45

21)        MORSE, Richard N. - São Paulo - Raízes Oitocentistas da Metrópoi - pág. 474

22)        PRADO Jr., Caio -  op. cit., pág. 229

23)        PRADOJr.,Caio- Forrnação do Brasil Contemporâneo pág-61

24)        Marzola, Nádia – História dos Bairros de São Paulo, volume 15- Prefeitura de São Paulo – Secretaria de Cultura – Dezembro de 1.979- página 34