Egydio Coelho da Silva e Suely Silvae
 

História da fundação  de Monte Verde
Camanducaia - Distrito de Monte Verde -MG - Brasil

 

Capítulo II – Verner e seu avião

Nascimento de uma

comunidade,
interpretação histórica

 Na falta de documento confiável, a maior parte dos historiadores prefere optar pela interpretação histórica de que o nascimento de uma comunidade se caracteriza, principalmente, quando um bem de uso comum é inaugurado.
Aí, então, não resta mais dúvida de que no local já existe uma comunidade.
É o caso, por exemplo, da cidade de São Paulo, cuja data de fundação se deu, em 25 de janeiro de 1554.
Nesta data, no hoje Pátio do Colégio, se celebrou a primeira missa, na escola recém inaugurada, que objetivava ensinar a religião católica e as primeiras letras às crianças e aos índios.
No bairro do Bixiga, que fica na sua maior parte no subdistrito da Bela Vista, também na cidade de São Paulo, o lançamento de uma pedra fundamental, para se construir um hospital, indica a data de sua fundação.
Em Monte Verde, ficou um pouco mais fácil localizar a data de sua fundação, porque encontrei documentos confiáveis e também pude entrevistar o próprio fundador.
E o início do desaparecimento da fazenda dos Grinbergs está devidamente documentado, com escrituras públicas registradas em cartório.
Trata-se da venda dos primeiros lotes de terreno, antes mesmo de se legalizar o loteamento da fazenda, que mostrava preocupação com a parte técnica de início de urbanização.
Embora muitas pessoas costumassem dizer que Verner teria doado terrenos aos seus amigos e patrícios, na verdade, ele declarava sempre que vendera os lotes e disse textualmente:
-"Vendi baratinho, mas não doei".
Na realidade, na época os terrenos embora grandes, não tinham muito valor, pois a cidade estava nascendo e não havia ainda estrutura urbana e a estrada, que ligava a fazenda a Camanducaia deixava muito a desejar.
Mas, o clima frio de montanha e a natureza já eram fascinantes e, por isso, foram aparecendo mais compradores.
E o preço facilitado, que Verner oferecia aos interessados, influenciava na decisão de compra.
A fazenda e, em seguida, da pequena vila, que começava a nascer, sempre se localizou no município de Camanducaia.
Seu isolamento, aparentemente, era forte, já que trinta quilômetros a separava da sede do município.
A estrada era muito ruim e conservá-la, para que ficasse transitável, sempre foi dificuldade imensa.
Era forte entrave nas atividades da fazenda e, mais tarde, no desenvolvimento da vila.

Pessoalmente, para Verner Grinberg e suas família, isto nunca foi problema muito sério, pois sempre teve avião.
Por isso, quando comprou a fazenda, uma das primeiras obras realizadas foi o aeroporto.
Verner era piloto e tinha avião (1)

(1) Verner era piloto e tinha avião


1957 - sete anos após a fundação

de Monte Verde

Foto enviada por Renate Wechsler  em 21 de agosto de 2006, residente na cidade de  Clearwater, no  estado da Flórida, nos  EUA (USA) acompanhada do seguinte texto:
"O Sr. Verner Grinberg, em frente ao seu aviao, e meu pai (Heinz Schueler) tirou a foto comigo quando eu tinha 12 anos de idade em 1957 e foi minha primeira viagem de aviao pequeno".

Quando adquiriu a fazenda já era um homem realizado financeiramente.
Ganhou dinheiro com a serraria, que ele e seu pai tinham na colônia de letônios, denominada Varpa (2), localizada no município de Paraguaçu Paulista, interior de São Paulo, agora pertence ao município de Tupã.
 

(2) Varpa (em letão: Vārpa), distrito pertencente ao município de Tupã-SP e conhecido por sua riqueza em recursos ecoturísticos.
Os pioneiros foram os imigrantes letões, predominantemente, religiosos batistas.
Vieram após um movimento messiânico, ocorrido na Letônia.
Desembarcavam da Europa no Porto de Santos e, após viagem de cerca de 22 horas pela Estrada de Ferro Sorocabana, chegaram à estação Sapezal (vila do atual município de Paraguaçu Paulista.
Daí, então, caminharam 31 quilômetros pela mata se estabeleceram na margem direita do Rio do Peixe. Em de 1922, fundaram a colônia Varpa e a Corporação Evangélica Palma (atual Fazenda Palma).
Na segunda metade da década de 1920 e durante a década de 1930, Varpa teve seu apogeu.
A Igreja Batista dali chegou a ser a maior do Brasil.
A colônia era praticamente autônoma economicamente, produzindo tudo o que consumia.
Contava então com mais de dois mil habitantes.
O idioma falado era o letão, pois a educação era proveniente de professoras da própria comunidade.
O português era ensinado precariamente na medida do possível.
Apenas em 1934, no governo de Getúlio Vargas se instalou uma escola primária oficial.
Hoje em Varpa, além da Fazenda Palma, a Expedição Varpa desenvolve o turismo local com canoagem, camping e visitas em cachoeiras, essas são as principais atrações turísticas do município de Tupã, que recentemente obteve do governo do estado de São Paulo o título de Estância Turística.
Muitos habitantes ainda preservam a cultura da Letônia.
Aqui o visitante encontra produtos gastronômicos caseiros, observa arquitetura típica e ecoturismo da Fazenda Palma.
Varpa tem o Museu Janis Edbergs, com rica coleção catalogada, que era mantida por um colono desde os primórdios do povoado.
O museu atualmente é mantido pelo Município.

 

Nas décadas de 1930 e 1940, Verner era o maior fornecedor de madeira para construção civil da capital paulista paulista.
E contava, com justificado orgulho:
-"A maior parte dos prédios de São Paulo foi construída com madeira que eu forneci".
Mas seu maior orgulho e satisfação foi ter fundado Monte Verde, pois amava a natureza e o clima frio de montanha.
Ele, porém, fazia questão de dividir isto com sua mulher Emília Leismer:
"As pessoas que nos visitavam na fazenda ou no início do nascimento da Vila eram muito cativadas pelas comidas típicas de nossa Letônia (2), que Emilia sabia fazer.

(2) Letônia ou Letónia, oficialmente República da Letônia, é uma nação europeia, sendo uma das três repúblicas bálticas.

Localização da Letônia na Europa.

 Limita a norte com a Estónia, a leste com a Rússia, a sudeste com a Bielorrússia, a sul com a Lituânia e a oeste com o mar Báltico.

A partir do século XII, os letões se convertem ao cristianismo, levado pelos alemães às tribos locais. 78,9% da população é cristã.

Tem litoral pantanoso, com dunas de areia e importantes portos pesqueiros. 

Riga, a capital, no seu bairro histórico, misturam-se edificações medievais e prédios art nouveau, declaradas patrimônio da humanidade.

As florestas cobrem quase metade do território, o que favorece o turismo ecológico, em especial na cidade de Sigulda, rodeada de cavernas, bosques e corredeiras.

 Ex-república da União Soviética, a Letônia conquista a independência em 1990.

Em 2004, a Letônia ingressou na União Europeia (UE).

 Ela é até mais fundadora de Monte Verde do que eu", dizia Verner modestamente.
Monte Verde viveu escondida do grande público durante quase duas décadas.
Em 1968, o Caderno de Turismo do Estado de São Paulo faz a primeira reportagem sobre Monte Verde e diz no título dessa matéria: "O Estado de S. Paulo descobre um paraíso escondido".
Após essa matéria, Monte Verde não parou de crescer, apesar de alguns moradores acharem que seria melhor se a estrada Monte Verde/Camanducaia nunca viesse a ser  asfaltada para manter a vila escondida e evitar que o progresso destruísse as belezas naturais.
Felizmente, Monte Verde tem administrado bem a convivência oferecida pelo progresso, procurando sempre um crescimento desde que seja sustentável.
Isto tem sido possível graças a preocupação dos moradores, que não aceitam nada, que altere as características da arquitetura de montanha e que afete a natureza.

São suas fortes atrações turísticas.

Quem é Verner Grinberg

Os pioneiros de Monte Verde são Verner Grinberg e sua esposa dona Emília e o sobrenome da família deu o nome à cidade: “grin”, verde, e “berg”, monte.
A família Grinberg chegou ao Brasil em 1.913 (Verner com três anos de idade), antes da Primeira Guerra Mundial.
Conforme conta Roberto Stikan (marido da neta de Verner):  "O  Sr. Verner, inclusive, muitas vezes mencionava que ele teve a grande felicidade de não ter visto nenhuma das duas grandes guerras, que envolveram a Europa, ao contrário de muitos dos seus patrícios e amigos letos.
De início, se instalaram em Pariquera-Açu.
Depois, por volta de 1916, se mudaram para São José dos Campos.
Foi somente em 1922, quando chegou um grupo de aproximadamente 2.000 imigrantes da Letônia, que ele se mudou para a Colônia Varpa.
Foi somente entre 1923 e 1924 que Varpa teve seu início, quando da chegada dos letos.
Conto isso não somente por conhecimento da história do Sr. Verner, mas também meus bisavós, avós e outros parentes (contemporâneos do Sr. Verner) fizeram parte do grupo de 1922 e residiram em Varpa até o final da vida deles”.
Verner faleceu aos 96 anos de idade, nasceu em 26 de maio de 1910, faleceu em 13 de agosto de 2006."
Seu entusiasmo por regiões frias no Brasil, que se assemelham a climas europeus, aflorou na época em que Verner, ainda menino, trabalhou com seu pai, Ernesto Grinberg, madeireiro, em Campos do Jordão."
E, por isso, ao se casar com dona Emília Leismeir, resolve passar sua lua de mel em Campos do Jordão. Agora jovem mais ainda se empolga com clima de montanha e com as paisagens da Serra da Mantiqueira.
Em 1.936, ouviu falar dos Campos do Jaguari (3), hoje Monte Verde, lugar de clima e paisagens semelhantes a Campos do Jordão.

Jaguari (3): palavra de origem indígena, significa ”rio da onça” (jaguar, onça, e “i”, rio).

 

Imbuído de espírito empreendedor, sobe até o pé da Serra da Mantiqueira em lombo de burro, abrindo picada no meio do mato. Em 1.938, ali adquire terras e inicia a formação de uma fazenda.
Conta Stican:
"Eles sempre quiseram viver em uma região semelhante e saudável. Foi nesta época que ouviram falar pela primeira vez dos “Campos do Jaguari”, local semelhante a Campos do Jordão (clima, montanhas e madeira abundante).
Não conseguiram, no entanto, precisar onde exatamente se localizavam os Campos do Jaguari.
Foi somente vários anos mais tarde, depois de já casado, que o Sr. Verner ouviu, de outro leto, Sr. Pumpurs, sobre a localização dos tais “campos”.
Esta região também ficava junto a Serra da Mantiqueira, distante em linha reta apenas 50 quilômetros de Campos do Jordão, embora no Estado de Minas Gerais.

Em 1936, Verner e seu pai decidem finalmente conhecer a tal “Campos do Jaguary”.

Levaram dois dias de viagem para chegar ao local.

Tomaram um trem da capital de São Paulo a Piracaia, dali a Joanópolis foram de automóvel, e para seguir adiante somente mesmo em lombo de burro.

Não havia estrada até o local, somente picadas entre as montanhas e ali permaneceram a 1500 metros de altitude num vale que ficava na base do Pico do Selado.

Durante três dias tentaram adquirir terras, mas não havia ninguém interessado em vendê-las.

Para a salvação dos viajantes já cansados, quando já estavam regressando, alguém veio correndo atrás dos Grinbergs, montados em seus burricos, perguntando se estavam interessados em adquirir alguma gleba.

Esse foi o início de uma fazenda que foi sendo formada pela família.

Ele, Dona Emília, o pai e um casal de primos montaram uma barraca de lona com dois quartos (homens em um e mulheres em outro) exatamente onde é o centro de Monte Verde.

Logo surge a primeira casa.

Com o passar do tempo, muitos de seus amigos e conhecidos começaram a sentir atração pelo lugar.

Por isso, decidiu vender lotes de terreno para que construíssem casa e viessem morar na fazenda, a qual assim foi se transformando em uma vila. 

Foi em 29 de novembro de 1.950 (data considerada como fundação da cidade), que Verner vendeu os dois primeiros lotes de terreno e, em 10 de julho de 1.955, registrou o primeiro loteamento de parte da fazenda.

Os primeiros, que mais se interessaram, foram seus aos amigos e parentes, geralmente adeptos de sua religião, a batista, e europeus.

Transformaram a antiga fazenda em vilarejo tipicamente alpino.

Sobre o fato do aeroporto de Monte Verde ter sido construído logo no início da cidade, apenas indica  que Verner sempre foi um apaixonado por avião. E era piloto desde muito jovem.

Diz orgulhoso que nunca sofreu um acidente e pilotou até os oitenta anos de idade.
“Nunca fiz um pequeno arranhão na lataria do avião”, dizia com satisfação.

Conta que não recebeu herança, pois meu pai nunca foi rico e não trouxe dinheiro nenhum consigo da Letônia.

Explica que chegou no Brasil quando ainda menino e seus pais foram morar em Paraguaçu Paulista, na colônia Varpa, composta por letões.
A família ganhou um pedaço de terra do Governo e seu pai montou uma pequena serraria e vivia do que colhia no sitio e da serraria. |
Quando adulto, Verner começa a trabalhar com madeira para a construção civil. E teve sucesso e diz orgulhoso.
“Muitos edifícios e casas importantes de São Paulo foram construídos com madeira preparada e fornecida por mim”.

Conta que praticamente não tem disponibilidade financeira, porque tudo que ganhou aplicou em terras.

 

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da Fundação de Monte Verde