Motivo, que
determinou a produção deste livro
Este livro surgiu porque, em reuniões da sociedade União do Bixiga
(1), se perguntava por que não havia um dia
para ser considerado como a data de fundação do bairro.
(1) União do Bixiga:
Entidade, tipo sociedade de amigos de bairro, fundada e presidida
inicialmente por Nélson de Abreu Pinto, proprietário do então Restaurante La
Távola.
Suas reuniões aconteciam no próprio
restaurante.
Tinha por finalidade unir todas as lideranças e entidades do bairro no
trabalho de melhorias e de preservação dos valores culturais do Bixiga.
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Alguns participantes da reunião se comprometeram a fazer
pesquisas, mas de antemão já havia quase consenso de que o bairro era muito
antigo; teria nascido pouco tempo depois da fundação de São Paulo que foi em
25 de janeiro de 1554.
Voltei para casa, matutando sobre esse assunto e me deu um estalo quando cai na real e entendi que não era
correta a interpretação de que o bairro era muito antigo.
Como poderia ser antigo se tudo mundo sabia que se tratava de
um bairro formado inicialmente pela maioria de imigrantes italianos (2)?
(2) Imigrantes italianos:
A intensa imigração de italianos, no final do século19, tornou a cidade
praticamente bilíngüe.
Indústrias e
bairros novos surgiram por todos os lados.
A cidade que, segundo o recenseamento de 1872, tinha pouco mais de 31.000
habitantes, alcançava 65.000 em 1.890 e cerca de 200.000 em 1900.
Um crescimento
espantoso de quase 700% em apenas 28 anos.
|
Ai então comecei a reler diversos livros, que falavam da
história do Bexiga
ou do Bixiga.
E esta pesquisa me levou a constatar que realmente o bairro
nascera num momento em que a imigração de italianos em São Paulo era muito
forte.
Encontrei então a data de primeiro de outubro de 1878, quando D. Pedro II
(3) lançou a pedra fundamental de um hospital
no bairro.
(3) Dom. Pedro II:
O segundo Imperador do Brasil reinou
durante 58 anos, era filho de Dom Pedro I, nasceu no Rio de Janeiro, em
dois de dezembro de 1825.
Foi batizado com o nome de Pedro de Alcântara
João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco
Xavier de Paula Leocádio Miguel.
A abdicação do pai tornara Pedro II
imperador com apenas cinco anos. Dom Pedro II demonstrou muito tirocínio e
sempre esteve atento às novidades tecnológicas do seu tempo e procurou, no
seu império, modernizar o Brasil.
Faleceu em Paris em
cinco
de dezembro de 1891, aos 66 anos.
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Este hospital não teve sequer sua construção iniciada, o que
confirma a máxima de um humorista argentino:
“La
piedra fundamental es la única que no es fundamental”.
No entanto, a inauguração solene do loteamento, contando com
a presença do Imperador, que lançou a pedra fundamental do hospital, mostra
que já havia uma pequena comunidade no local.
Encontrei também, um anúncio de terrenos no
Bexiga
(4), no mesmo loteamento, onde o hospital
deveria ser construído.
O anúncio, publicado em 28 de julho de 1878, dois meses antes
do lançamento da pedra fundamental do hospital, evidencia que o loteamento
já estava legalizado.
Muito embora não deixe claro se já havia moradores no bairro.
(4)
Terrenos
do Bexiga:
Vendem-se magníficos terrenos às braças ou em grandes lotes, com
pastos ou matas, a vontade do comprador.
Não há nada a desejar nestes terrenos dentro da cidade, água corrente, em
diversas fontes, lindos golpes de vista para as bonitas chácaras, ruas de 60
palmos de largura.
Preços baratíssimos, desde 20$, 30$, 40$ até 50$000 a braça, com 30 braças e
mais de fundo, conforme a localidade escolhida.
A planta acha-se nas oficinas de Santo Antonio, no Bexiga,
podendo ser examinado a qualquer hora, tanto a planta como os terrenos.
Para
tratar com proprietários na mesma oficina ou com E. Rangel Pestana, na Rua
Imperatriz n. 44. (Anúncio, publicado em “A Província de S. Paulo”, hoje O
Estado de S. Paulo em 28/07/1878.)
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Este fato poderia gerar a interpretação de que, se
alguns lotes já tinham sido vendidos, o bairro havia nascido antes do
lançamento da pedra fundamental do hospital.
Mas o que consolida o nascimento do bairro, com certeza, é o inicio de
construção de um bem público.
Neste caso, o hospital, que seria usado pelos moradores.
A prova de que o bairro realmente nasceu em 1º de outubro de
1878 ficou ofuscada, quando localizei um ofício de
30 de janeiro de 1793, dando conta de que as
autoridades municipais autorizaram o transporte de pedras para ao primitivo
chafariz do Bexiga.
Este fato está registrado no Arquivo Aguirra (34).
(34) Arquivo Aguirra.
Acervo documental produzido, coletado e organizado por João Baptista de
Campos Aguirra (1871-1962).
Trata-se de coleção de fichas, mapas, cadastros, livros, fotografias, entre
outros itens, que integram um dos fundos do Serviço de Documentação Textual
e Iconográfica do Museu Paulista da Universidade de São Paulo.
|
Portanto,
em 1793, já se registra que a região, denominada Bexiga, existia.
Embora não fosse ainda uma
comunidade com costumes e objetivos comuns.
Agora, então, eram 85 anos antes
do ato solene de inauguração do loteamento, que me parecia mais correto para o
surgimento do bairro, ocupado por maioria de italianos.
Acrescente que, um ano
depois, em seis de fevereiro de 1794, uma escritura pública também deu nome
de Chácara do Bexiga
à região toda.
Portanto,
84 antes da data por mim interpretada, que seria a da fundação do bairro do
Bixiga.
E
por que, então, julgaria eu que o bairro do Bixiga não era um bairro bem
antigo, contrariando o entendimento da maioria?
Parti da interpretação de que a data de fundação de um bairro ou de uma cidade
deve ser o momento, em que a comunidade começa a surgir,
como aconteceu com a cidade de São Paulo, que praticamente nasceu, quando se
inaugurou o Colégio dos Jesuítas (11).
(11) Colégio dos
Jesuítas
No dia 25 de janeiro de 1554, com a
participação dos nativos, se construiu uma capela rústica, cujo objetivo era
a catequese dos índios e também o de servir de abrigo a viajantes
. 
O colégio e a pousada, situados entre
os Ribeirões Tamanduateí
e Anhangabaú, ganharam fama entre os moradores do litoral
e a vila começou acrescer.

Em
1824, a
capela, o Colégio e o povoado na visão do pintor Baptiste
Debret.
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Na maioria das cidades, quando não se encontra documento
robusto e confiável, os historiadores consideram que a fundação das cidades
se dá na data da escritura de doação de terreno para construção de um bem
público a ser usado pela nascente comunidade.
E quase todas as cidades brasileiras têm como data de
fundação o dia em que uma pessoa, que é considerada a fundadora, doa terreno
para construção de um bem público.
Normalmente, o terreno se destina à construção de igreja, mas
poderia ser hospital, escola, praça pública, estação ferroviária ou
rodoviária.
Até mesmo um campo de futebol.
No caso do Bixiga, entendi que a melhor data é realmente 1º
de outubro de 1878, quando D. Pedro II, imperador do Brasil, lançou a pedra
fundamental de um hospital no terreno, doado por
Antônio José Leite Braga
(6), no loteamento, que o
fundador arruara no início da Chácara do Bexiga.
(6)
Antônio José Leite Braga, proprietário do loteamento do Bixiga,
ofereceu uma quadra
de seus terrenos, com 8475 braças quadradas, à Irmandade da Santa Casa de
Misericórdia.
Na carta, que enviou à Irmandade, Leite Braga diz que é "irmão" da Santa
Casa, mas, "quando não fosse, isto não me abafaria
o desejo de ser útil a uma instituição tão merecida do auxílio de todos".
Conta nessa carta que chegou ao
Brasil quando ainda criança e aqui conseguiu recursos que lhe permitiram
agora fazer essa doação "a favor dos necessitados" (esta carta foi publicada
no jornal "A Província de São Paulo", em 02/10/1878).
Porém,
havia nessa doação uma cláusula: a Santa Casa teria que construir na quadra
doada um hospital, destinado aos pobres de São Paulo.
E as
obras deveriam se iniciar dentro de dois anos.
A
Santa Casa aceitou a doação, mas não cumpriu a cláusula, que a obrigava a
construir o hospital no Bixiga.
Preferiu investir no imóvel, próximo ao hoje Largo do Arouche, em vez de
desviar recursos para outro empreendimento.
Antônio José Leite Braga faleceu, pouco tempo depois.
Após
seu falecimento, a viúva, Eugênia de Araújo Braga, se casou, em segundas
núpcias, com Fernando de Albuquerque, que prosseguiu nas vendas dos lotes e,
conseqüentemente, na formação do bairro do Bixiga.
|
Espero que este
livro não tenha apenas a utilidade de provar a verdadeira data de fundação
do bairro, mas que sirva também de orientação a todos os que desejam
descobrir a verdadeira data de fundação de sua cidade, de seu bairro ou de
sua comunidade.
Nas minhas
pesquisas, constatei que há cidades e bairros, que têm a data de fundação
alicerçada na primeira prova de que a comunidade já existia ou começava a
nascer.
A maioria das
cidades escolhe a data correta da sua fundação.
Algumas, porém,
nem sempre.
Confundem datas históricas importantes com a data de fundação.
Exemplo de
descuido com a data de fundação, encontrei na
história da cidade de Marília.
Recordo-me do diretor do
jornal, Correio de Marília, Anselmo Scarano, me dizer, na década de 1970,
num encontro de diretores de jornais na sede do
CBI (8),
que seu jornal era mais velho do que a sua cidade.
Seu jornal fora fundado no dia 1º de maio de 1928.
(8) – CBI-Consórcio brasileiro de imprensa, empresa com sede
em São Paulo, que na época já era representante de mais de 60 jornais do
interior do Estado de São Paulo.
|
Ironicamente
ele censurava a escolha de uma data posterior à verdadeira data de fundação
da cidade.
Pois, quatro de abril de 1929 é festejado como sendo a data de fundação de
Marília (7).
(7)
Marília começa a nascer, quando Bento de Abreu Sampaio Vidal abre um
loteamento em seu patrimônio, sabendo que a Companhia Paulista de Estradas
de Ferro vinha avançando seus trilhos.
A Paulista tinha por norma inaugurar as estações em ordem alfabética.
Como a estação anterior era Lácio, logo a próxima deveria se iniciar com a
letra "M".
A própria Companhia Paulista então sugeriu a Bento de
Abreu os nomes de “Marathona”, “Mogúncio” e “Macau”.
Ele não gostou de nenhum e escolheu o nome de Marília, pois lera e se
emocionara com o poema de Tomás Antônio Gonzaga, “Marília de Dirceu”.
Como distrito, já denominado Marília, foi criado em 22 de dezembro de 1926.
Elevada a município, sua instalação oficial se deu
a quatro de abril de 1929, data em que é comemorada
sua fundação.
|
Provavelmente, quem fez a pesquisa da história de Marília procurou uma data
que, na ocasião, seria mais interessante, talvez até mais emocionante.
Não
se preocupou com a data correta da fundação.
Mas, a verdade histórica é que já existia uma comunidade muito ativa e forte
no local e até havia um jornal circulando há quase
um ano antes da data considerada de fundação da cidade.
É de se
acreditar que dirigentes políticos da cidade optaram pela data de
emancipação política de Marília, porque lhes era conveniente do ponto de
vista político-eleitoral.
Trata-se de
procedimento costumeiro em muitas cidades do interior do Brasil.
Portanto,
constata-se que se escolheu uma data histórica importante, mas não a
verdadeira data de sua fundação.
É pena que não
haja maior desejo de se apurar a data correta de fundação de comunidades:
cidades, distritos ou bairros.
A mim, me
parece que é fundamental fazer justiça à memória dos verdadeiros fundadores.
Não há de minha parte intenção de criticar especificamente a aparente falta
de preocupação com a verdade histórica de Marília.
Na realidade, muitas outras cidades fizeram a mesma coisa.
Tão somente
esta citação tem objetivos didático e histórico.
Ela é apenas
um exemplo, pois igual a Marília, existem muitas outras cidades, que
adotaram o mesmo critério: escolheram uma data histórica importante para
indicar a fundação da cidade.
Na maioria dos
casos, a emancipação política.
Evidentemente que a data mais importante, inclusive da vida pessoal de cada
um, é a primeira.
Por isso que,
para cada indivíduo, sua data de nascimento é sempre a mais importante de
todas as que marcaram sua existência.
Nem poderia ser
diferente, porque nenhum outro acontecimento de sua vida teria sequer
existido se não houvesse seu nascimento.
Com as cidades e bairros é a mesma coisa.
Não haveria
outras datas históricas importantes para a comunidade, como elevação à
condição de vila, de distrito, emancipação, etc. se a sua fundação não
tivesse acontecido.
Emancipação
política, elevação à comarca sequer teriam existido se não houvesse a
fundação.
Portanto, a data de fundação é, sem dúvida, a data mais importante de uma
comunidade.
E é na busca
desta data que o pesquisador deve se ater por
questão de fidelidade à verdade histórica.
Como exemplo de
data correta de fundação, podemos citar a cidade de Assis, interior do
estado de São Paulo.
Sua fundação se deu em 1º de julho de 1905, quando Francisco de Assis Nogueira
(9), que tinha o título de capitão, doou terreno para construção de uma
igreja.
(9) Capitão Francisco de
Assis Nogueira.
Era bandeirante, por
índole e formação.
Chefe de prestigio nas
zonas, que povoava.
Sertanista experiente, muito respeitado, pelo seu bandeirantismo.
Deixou a cidade de
Botucatu, quando esta já era comarca.
Ganhou os sertões da
Alta Sorocabana.
Expulsou os índios.
Fundou povoações, principalmente a cidade de Assis, cujo nome relembra seu
fundador.
Nasceu em Baependi-MG, no ano de 1821 e
faleceu em julho de 1908, filho de Francisco de Assis Nogueira.
Tri-neto do Capitão Tomé
Rodrigues Nogueira do Ó, fundador da cidade de Baependi-MG.
|
O nascente povoado recebeu o
nome de Assis, em homenagem ao seu fundador, Capitão Francisco de Assis
Nogueira, e do santo de sua devoção, São Francisco de Assis.
Capitão Francisco registrou a doação do terreno para construção da igreja em
Assis na comarca de Campos Novos Paulista (10).
(10) Campos Novos do
Paranapanema
Atual, Campos Novos Paulista pode ser considerada a cidade que Assis fez
encolher e ficar anã.
Campos Novos, a mais
antiga cidade do Sertão do Paranapanema, começou a nascer por volta de 1852, quando José Teodoro de Souza, mineiro de Pouso
Alegre, chegou à região, onde construiu diversas casas.
Em 1856, requereu às
autoridades de Botucatu a posse das terras.
Nelas, construiu uma
capela invocando São José, às margens do rio Novo (afluente do rio
Paranapanema).
Em 1885, passou a município e elevado à comarca em
1892.
Era
uma das três cidades mais importantes existentes no oeste do sertão
paulista.
A
mais próxima da capital de São Paulo era Sorocaba, mais ao interior,
aparecia Botucatu e, a cerca de 500 km, ficava Campos Novos.
Quando se iniciou a construção da Estrada de Ferro Sorocabana, o projeto de
sua penetração pelo interior de São Paulo previa sua passagem por Campos
Novos.
Porém, os políticos locais entenderam que isto seria prejudicial porque
aumentaria a insegurança e traria maus costumes à pacata cidade.
A
partir de 1914, quando os trilhos da Estrada de Ferro Sorocabana chegaram a
Assis, a maior parte da sua população migrou para Assis.
Posteriormente, até a comarca foi transferida para Assis.
Campos Novos Paulista, que seria hoje uma das maiores cidades do interior de
São Paulo, estacionou e regrediu.
Talvez até tenha sido melhor: cidade pacata e com o melhor clima da região.
Sua
população em 2015 não chegava a cinco mil habitantes.
É um dos 15 municípios paulistas considerados estâncias
climáticas do Estado de São Paulo.
|
Também devemos
destacar como correta a data de fundação da capital do Estado de São Paulo,
cujos historiadores optaram pelo dia, em que se deu a instalação do Colégio
dos Jesuítas.
Até então, em
São Paulo, havia apenas aldeias indígenas.
Antes de 25 de janeiro de 1554, em São Paulo, havia apenas
aldeias indígenas e a mais importante, com relação ao nascimento da cidade,
era, com certeza, a chefiada pelo
cacique Tibiriçá
(12).
(12) Cacique Tibiriçá, nascido por volta de 1480, Tibiriçá (“maioral” em tupi) era um cacique,
cuja aldeia tinha sede no Inhampuambuçu (lugar que se vê de longe), Largo
são Bento.
Teve diversos filhos com diversas índias e
a sua preferida era Potira, mãe da maioria deles. Em 1513 acolheu o naúfrago
português, João Ramalho.
Tibiriçá se aproxima dos colonos
portugueses, oferecendo apoio. Outros caciques achavam a atitude de Tibiriçá
impensada e maluca.
Em 1553, os jesuítas chegaram ao Planalto
de Piratininga e logo perceberam
que a melhor forma de catequizar os índios era se aproximando de Tibiriçá.
Com ajuda de Tibiriçá, no dia 25 de Janeiro de 1554 inauguraram o Colégio
Jesúita de São Paulo.
Tibiriçá inclusive transferiu sua tribo
para aréa com o objetivo de proteger os jesuítas do ataque de outros índios.
Ao redor do Colégio surgiu um povoado, que passou a se chamar Vila de São
Paulo de Piratininga.
Por volta de 1560 os líderes tamoios
convidaram Tibiriçá, de quase 80 anos, a participar da aliança.
Ele enganou os tamoios dizendo que se aliaria.
No dia do ataque os portugueses já estavam preparados e derrotaram os
tamoios.
Tibiriçá matou seu próprio sobrinho, Jagoanharó, filho de Piquerobi, mas
foi gravemente ferido.
Tibiriçá veio a falecer no Natal de 1562 na Vila de São Paulo de
Piratininga com mais de oitenta anos. Teve seus restos mortais acolhidos na
Igreja da Praça da Sé.
|
O cacique Tibiriçá era índio
tupiniquim (13).
(13)Tupiniquins, também chamados tupinaquis, topinaquis
e tupinanquins.
A origem da palavra teria como raiz a
expressão tupinã-ki, ou
"tribo colateral, o galho dos tupis".
Habitavam, por volta do século XVI, duas
regiões do litoral do Brasil: o sul do atual estado da Bahia e o litoral do
atual Estado de São Paulo, entre Cananeia e Bertioga.
Trata-se do grupo indígena com o qual se
deparou a esquadra portuguesa de Pedro Álvares Cabral em 23 de abril de
1500.
Os colonizadores portugueses fizeram amizade com os
tupiniquins e passaram a frequentar as suas
aldeias.
Queriam a aliança, com o intuito de proteger a vila de São
Vicente.
Isto foi bom para os lusitanos, mas não para os
tupiniquins, que tiveram de enfrentar a ira dos tupinambás, que atacaram e
dizimaram a população de várias de suas aldeias.
|
Sua aldeia ficava na confluência do ribeirão
Anhangabaú
(14)
(14) Anhangabaú (anhangá-y):
Alguns
historiadores interpretam que Anhangabaú, na linguagem indígena, significa
lugar de "muitos maus espíritos".
Mas Anhangabaú
também significa muitas coisas ruins.
Neste caso, as águas
eram ruins para beber e provocavam doenças.
Os índios tinham razão, pois, já no século XVII, se constatava que suas
águas eram salobras e causavam doenças.
E o engenheiro Sanchez d'Oria,
em 1791, examinou as águas do
Riacho
Yacuba, (Yacuba ou Acu, significa em Tupi "água envenenada"), que nascia na confluência da Rua Brigadeiro
Tobias com a então ladeira da Santa Ifigênia.
Descia pela Praça do Correio,
serpenteando, até desaguar no Anhangabaú.
Sanchez d'Oria
comprovou:
"É água ácida e
vitriólica, com base calcária de oca e partículas
arsenicais, sumamente saturada de gás mefítico".
O Anhangabaú é alimentado principalmente pela
confluência de três cursos d'água,
hoje canalizados:
córrego Saracura
(sob a
Avenida 9 de Julho),
córrego Itororó
(sob a
Avenida 23 de Maio)
e
córrego Bexiga
(sob o edifício Japurá e Câmara Municipal).
O ribeirão Anhangabaú, a partir do
antigo Largo do Bexiga, atual Praça da Bandeira, segue
canalizado
sob o
Vale do Anhangabaú
e deságua no ribeirão Tamanduateí, na altura do
Mercado Municipal.
|
e do ribeirão Tamanduateí (15),
(15)
Tamanduateí, a palavra de
origem
tupi significa rio dos
tamanduás-bandeiras. Suas nascentes estão no município de Mauá.
Passa também pelos municípios de
Santo André e
São Caetano do Sul e
deságua no
rio Tietê,
em
São Paulo.
Entre
as décadas de 1870 e 1880, o ribeirão Tamanduateí tinha uma pequena ilhota,
chamada de "Ilha dos Amores", ajardinada, ficava próxima da atual Rua 25 de
Março; mantinha quiosques com bebidas e comidas, além de uma casa de banho e
espaço para o descanso; era ponto de lazer do paulistano. Após vários
alagamentos, a ilha foi abandonada e deixou de existir no início do século
XX.
|
cujo local os índios chamavam de
Inhampuambuçu
(16),
onde é hoje o Largo São Bento.
(16)
Inhampuambuçu
(lugar que se vê de longe): a colina, que ficava entre o vale do ribeirão
Tamanduateí e o do ribeirão Anhangabaú, hoje Largo de São Bento. |
Já havia aqui uma nascente comunidade, chefiada por Tibiriçá,
com muita "assessoria" de seu genro, João Ramalho
(17), que era
"casado" com diversas índias, e já tinha muitos filhos.
17)
João
Ramalho
nasceu em
Vouzela, em
1493 e faleceu em
São Paulo em
1580, aos 87 anos.
Aventureiro, explorador
português, que se internou
pelo mato e se confraternizou com os índios. Era casado em Portugal
com Catarina Fernandes, a quem
nunca mais viu depois da
partida
em
1512
em uma
nau,
sonhando encontrar a "Ilha do Paraíso", que se localizaria, onde é
hoje o
Brasil.
Naufragou na
costa da futura
capitania de São Vicente, por volta de
1513. Encontrado pelos índios, com eles
fez amizade e adquiriu prestígio. Casou inslusive com
Bartira, filha do cacique Tibiriçá e com
ela teve nove filhos. Ramalho, além desses filhos, teve muitos
outros com outras índias, filhas de caciques.
Na cultura nativa havia grande liberdade sexual e, também o costume
e norma pelas quais um homem, ao se casar com uma mulher de uma
determinada tribo, passava a ser membro dessa mesma tribo.
Assim, João Ramalho estabeleceu vínculos muito fortes com muitos
caciques.
|
Portanto, os primeiros paulistanos já tinham nascido.
Mas, provavelmente, a
principal história de amor de João Ramalho surgiu, quando ele fez amizade
com o cacique Tibiriçá, que era chefe de uma enorme parte da nação indígena,
estabelecida no hoje Planalto Paulista.
Conheceu, então, Bartira e
com ela se casa, pois, além da vantagem de ser filha do cacique, era bonita,
logo um bom partido. João Ramalho não vacilou.
Acrescentou Bartira ao rol de
suas esposas e a nomeou a predileta.
Havia, pois, no
local uma pequena comunidade, formada por índios da tribo de Tibiriça e
alguns mamelucos, principalmente filhos de Ramalho, com muita promiscuidade
no conceito da religião católica na época, que não admitia a bigamia.
Talvez
este ambiente, que contrariava o conceito moral dos religiosos, fortaleceu a
convicção do padre Manuel da Nóbrega (18)em
instalar nos Campos de Piratininga (19) um
colégio.
(18) Padre
Manuel da Nóbrega
nasceu, em 18 de outubro de 1517, em Portugal e faleceu no Rio de
Janeiro em18 de dezembro de 1570, aos 53 anos.
Formado em filosofia e direito canônico pela
Universidade de Coimbra.
Pleiteou a cadeira de lente da
Universidade, mas foi recusado por sofrer de gagueira.
Aos 27 anos, foi ordenado
pela
Companhia de Jesus
em 1544. A ele se atribui o pioneirismo de ser o chefe
da primeira missão dos jesuítas na
América.
A convite do rei
dom João III,
veio para o Brasil na armada de
Tomé de Sousa.
Chegou à Bahia em 29 de março de 1549.
Deu início ao trabalho de
catequese dos
indígenas
e fez intensa campanha contra a
antropofagia
existente entre os nativos, mas, ao mesmo tempo, combateu a sua
exploração pelo
homem branco.
Em 1549, comandou a fundação do primeiro Colégio dos
Jesuítas em Salvador na Bahia e chefiou também a implantação
do
Colégio dos Jesuitas em São Paulo em 1554.
Em 1558, convenceu o
governador
Mem de Sá
a aprovar leis de proteção aos índios, impedindo que fossem
escravizados.
|
O objetivo era ensinar aos nativos a religião, seus valores
morais e a língua portuguesa, inclusive o Latim, que aos jesuítas era
fundamental para que as liturgias católicas fossem melhor assimiladas.
O Colégio
dos Jesuítas, portanto, foi o primeiro bem público, inaugurado em 25 de
janeiro de 1854, que é, sem dúvida, a melhor e mais documentada marca da
comunidade em formação, que viria a ser a cidade de São Paulo.
Poderia
alguém questionar e dizer que isto se deu antes da história de amor de João
Ramalho e Bartira, "a qual, no meio a tantas, lhe mexeu com o coração".
O
casal deixou uma descendência colossal, gerando os primeiros paulistas.
No bairro
das Perdizes em São Paulo há duas ruas paralelas, uma com o nome de João
Ramalho e a outra com o nome de Bartira.
Quem deu nome a essas ruas, com
certeza, tencionava destacar que ambos sempre se mantiveram muito próximos
um do outro.
Mas,
ironicamente, embora próximos, por serem paralelas entre si os dois jamais
se encontrariam...
De Bartira e Ramalho descendem milhões de brasileiros, espalhados sobretudo
por diversos estados, princi-palmente em
São Paulo.
O padre Manuel da Nóbrega, ao instalar nos Campos de Piratininga (19) um
colégio, tinha como objetivou ensinar aos nativos a reli-gião, seus valores
morais e a língua portugue-sa.
Inclusive o Latim, que aos jesuítas era
fundamental para que as liturgias católicas fossem melhor assimiladas.
O Colégio dos Jesuítas, portanto, foi o primeiro bem público, inaugurado em
25 de janeiro de 1854, que é, sem dúvida, a melhor e mais documentada marca
da comunidade em for-mação, que viria a ser a cidade de São Paulo.
Poderia alguém questionar e dizer que isto se deu antes da história de amor
de João Ramalho e Bartira, "a qual, no meio a tantas, lhe mexeu com o
coração".
O casal deixou uma descendência colossal, gerando os primeiros paulistas.
No bairro das Perdizes em São Paulo, há duas ruas paralelas, uma com o nome
de João Ramalho e a outra com o nome de Bartira.
Quem deu nome a essas ruas, com certeza, tencionava destacar que ambos
sempre se mantiveram muito próximos um do outro.
Mas, ironicamente, embora próximos, por serem parale-las entre si os dois
jamais se encontrariam...
De Bartira e Ramalho descendem milhões de brasileiros, espalhados por
diversos estados, principalmente em São Paulo. (página 37)
O padre Manuel da Nóbrega, ao instalar nos
Campos de Piratininga (19) um
colégio, tinha como objetivou ensinar aos nativos a religião e seus
valores morais.
(19) Piratininga:
do Tupi Guarani, pira=peixe, e tining =seco: Nome
indígena da região, onde hoje é a cidade de São Paulo. O Rio Tietê
tinha muito peixe.
Quando transbordava e, depois voltava ao leito, a
várzea (áreas ao
largo do rio, onde hoje são os bairros do Bom Retiro, Brás, Mooca)
ficava cheia de peixes “encalhados”.
Segundo o padre José
de Anchieta, até 12 mil peixes ficavam “secando ao sol”. |
João Ramalho foi o primeiro europeu a subir a
serra, então chamada de Paranapiacaba
(20)
em direção ao planalto, onde fica hoje a cidade de São Paulo.
(20)
Paranapiacaba:
em linguagem indígena:
"lugar de onde se vê o mar". |
Poderia pelo fato de João Ramalho e Bartira terem tido muitos filhos, antes
da inauguração do Colégio, ser considerado por um historiador, mais
preocupado com a formação étnica da população, que o primeiro paulista e
paulistano veio ao mundo quando nasceu o primogênito do casal João
Ramalho-Bartira.
Pois,
aqui já há a miscigenação de branco com índia e teriam então iniciado a
criação do povo paulista e paulistano. O primogênico do casal João
Ramalho-Bartira deve ser considerado o primeiro paulistano.
Seria uma interpretação semelhante a que José de Alencar (21) deu ao
surgimento do primeiro cearense, quando nasce o filho, Moacir,
(21) José de
Alencar, escritor brasileiro nas-ceu em 1829. Sua obra principal,
Iracema é, de certa forma, uma epopeia sobre a origem do estado do
Ceará.
Tem como personagem principal a índia Iracema, a "virgem dos lábios
de mel" e dos "cabelos tão negros como a asa da graúna".
Trata-se de um romance escrito em prosa poética, mas sempre apoiado
em argumento histórico.
Iracema, escrito em 1865, trazia
o subtítulo "Lenda do Ceará".
Alencar era cearense e confessa, em carta, que havia se inspirado em
uma lenda, que ouviu, quando criança, sobre como surgira o
“primeiro cearense” |
de
seu personagem histórico, Martim Soares Moreno (22) e de sua personagem de
ficção, a índia Iracema.
Neste mesmo sentido de formação étnica de um povo, João Ramalho, Bartira e
seus filhos seriam as primeiras famílias paulistas.
Em Iracema, José de Alencar interpreta que o primeiro cearense é Moacir,
filho de seu personagem histórico, Martim Soares Moreno (22).
(22) Martim Soares Moreno,
soldado português, nasceu em 1586, fundador do Ceará, é o personagem
histórico de José de Alencar.
Martim se enamora da personagem fictícia Iracema, com a qual teve um
filho, Moacir, que seria o primei-ro cearense. Aqui a história se
mistura com a ficção.
Martim Soares Moreno era ainda adolescente, quando participou da
expedição de Pero Coelho de Souza ao Ceará em 1603, e aprendeu a
língua dos índios e seus costumes.
Deu-se muito bem com os nativos, fez amizades, e a até passou a
fazer parte de família indígina.
Tornou-se, mais tarde em 1612, o virtual fundador daquela capitania,
hoje Estado do Ceará. |
Igual interpretação sobre a origem do primeiro brasileiro, filho de Diogo
Álvares Correa, o Caramuru, (23) e de sua
(23)
Caramuru: Diogo Álvares Correa, fidalgo da Casa Real, viajando para
São Vicente por volta de 1510, naufragou, em Salvador, na Bahia.
Seus com-panheiros foram mortos pelos índios tupinambás.
Como foi o único sobrevivente, não sacrificado pelos tupinambás, em
torno de si surgiram muitas lendas, nenhuma comprovada. Foi chamado
pelos índios de Caramuru, que significa moreia, uma espécie de
pei-xe sem osso, pois, Diogo fora encontrado no meio de pedras na
praia, como costumeiramente acontece com esse tipo de peixe. Sua
atuação foi fundamental para a integração dos índios e com os
portugueses durante o início da colonização do Brasil. |
mulher, a princesa tupinambá (24),
(24)
Tupinambá, a palavra significa "todos da família dos "tupis". Este
povo indígena falava o tupi antigo. |
Catarina Para-guaçu (25).
Seus filhos formaram a primeira família brasileira registrada em 1528.
(25) Catarina
Álvares Paraguaçu:
Era uma indígena tupinambá, da região, onde é hoje o estado da
Bahia. Segundo a certidão do batismo, de 30 de Julho de 1528 em
Saint-Malo, na França, o seu nome verdadeiro seria "Guaibimpará" e
não "Para-guaçu" (nome que significa "mar grande"), como re-gistra
Santa Rita Durão em seu poema Caramuru.
Oferecida como esposa por seu pai, o cacique Taparica, a Diogo
Álvares, este prontamente aceitou a oferta. O náufrago português já
gozava de muito prestígio entre os Tupinambás da Bahia.
O casal formou a primeira família documentada do Brasil. Guaibimpará
ou Paraguaçu é considerada a mãe biológica de boa parte da nação
brasileira. |
Mas, neste livro, não estou à procura de exemplo da ori-gem de uma
determinada naturalidade ou nacionalidade, mas sim na busca da data de
nascimento de uma comunidade.
É quase unanimidade e - na minha opinião também – que não há dúvida de que a
data correta da fundação de São Paulo é realmente 25 de janeiro de 1554,
quando se inaugurou um bem público, o Colégio dos Jesuítas, que seria
utilizado por esta comunidade.
Começava a nascer, então, a cidade de São Paulo.
Outros exemplos no Brasil, de datas de fundação muito bem escolhidas,
existem iguais ou semelhantes ao da cidade de São Paulo.
Mas, não vamos cansar o leitor com mais exemplos, que apenas confirmam que a
data histórica mais importante de uma comunidade é a da sua fundação.
E, para comprová-la, é fundamental haver algum documento, que dê garantia à
verdade histórica.
E, na falta deste, o melhor ainda é a prova de inauguração de um primeiro
bem público de uso comum da comunidade, a qual, com certeza, já existia
ainda que rudimentar.
Também devemos discutir a figura do fundador de uma cidade ou de um bairro,
o qual normalmente é aquele que doa terreno para a edificação de um bem
público de uso da comunidade embrionária.
Fundador, normalmente, é quem doa terreno para a edificação de um bem
público de uso da comunidade embrionária.
No bairro do Bixiga, o fundador deve ser considerado Antonio José Leite
Braga, que doou o terreno para a construção do hospital, a qual não chegou a
ser executada.
Se a quase unanimidade dos historiadores concorda com a data de fundação da
cidade de São Paulo, o mesmo não acontece com a interpretação de quem seria
o fundador da capital paulista.
As terras eram território da tribo, chefiada por Tibiriçá, que ocupava a
região.
Porém, índio não tinha o conceito de propriedade (26) de terra, que temos
nós, os "civilizados".
(26) conceito
de propriedade indígena:
Em 1855, respondendo à proposta de compra de terra do presidente dos
Estados Unidos, Francis Pierce, o cacique Seattle, da tribo
Suquamish, do Estado de Washington, pergunta:
"Como se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra?"
E explica seu conceito sobre a propriedade de terra:
"Tal idéia é estranha. Toda esta terra é sagrada para o meu povo.
Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver.
O homem branco não valoriza sua terra. Deixa para trás o túmulo de
seu pai sem remorsos. Rouba a terra de seus filhos, nada respeita.
Esquece os antepassados e os direitos dos filhos.
Sua ganância empobrece a terra e deixa atrás de si os desertos.
Suas cidades são um tormento para os olhos do homem vermelho, mas
talvez seja assim por ser o homem vermelho um selvagem, que nada
compreende.
O homem branco talvez venha um dia descobrir: o nosso Deus é o mesmo
Deus.
Julga, talvez, que pode ser dono Dele da mesma maneira como deseja
possuir a nossa terra.
Esta terra é querida por Ele. |
Se te vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos.
Protege-a como nós a protegíamos". |
Nosso costume de doar, comprar ou vender terra era inconcebível aos nativos,
que consideravam a terra como propriedade de todos.
Tibiriçá, provavelmente, achava que a terra pertence a quem a usa.
No entanto, no mínimo, entendia que o espaço ocupado por sua tribo era seu
território e de sua tribo, agora ampliada com a presença do genro, João
Ramalho, e seus descendentes.
De certa forma, cedeu espaço para instalação do Colégio dos Jesuítas.
Os índios, com certeza, têm consciência do território que lhes pertence,
como acontece até com a maior parte dos animais.
E o hoje Pátio do Colégio, distante apenas cerca de 500 metros de sua
aldeia, Inhampuambuçu (lugar, visto de longe), que se localizava, onde hoje
se encontra a Igreja do Largo de São Bento, com certeza, era considerado
território da tribo de Tibiriçá.
E João Ramalho, seu genro, já fazia parte de sua família.
É de supor que a decisão desta "doação" se deveu mais a João Ramalho, que
tinha muitos motivos para ver seus patrícios e dirigentes de sua religião
instalados no território de seu sogro.
A glória de ser o fundador de São Paulo até hoje pertence, no conceito
geral, ensinado na maioria dos bancos escolares, ao Padre José de Anchieta
(27).
(27) Padre
José de Anchieta nasceu em 1534, no arquipélago das Canárias.
Sua mãe era filha de judeus cristãos-novos.
Anchieta viveu com a família até os quatorze anos de idade, quando
se mudou para Coimbra, em Portugal, a fim de estudar filosofia.
A ascendência judaica foi determinante para que o enviassem para
estudar em Portugal, uma vez que na Espanha, à época, a Inquisição
era mais rigorosa. Ingressou aos 17 anos na Companhia de Jesus.
Temendo por sua saúde frágil, seu superior o enviou ao Brasil, por
acreditar que novos ares seriam benignos para o noviço.
Com menos de 20 anos de idade, chegou a Salvador em 13 de Julho de
1553. Veio para São Vicente em outubro do mesmo ano, portanto, três
meses antes da fundação de São Paulo.
Anchieta colaborou intensamente na penetração das selvas, aprendendo
a língua tupi, catequizando e ensinando os índios, inclusive latim,
para melhor entenderem a liturgia católica.
Em 1563, demonstrou habilidade diplomática ao participar do conflito
conhecido como a Confederação dos Tamoios, como mediador da paz
entre os portugueses e os índios. Feito refém pelos indígenas de
Iperoig (região, onde se encontra a cidade de Ubatuba) e ali
permaneceu durante cinco meses.
O episódio gerou o primeiro tratado de paz entre colonizadores e
indígenas, evitando que os índios, enfurecidos, destruíssem as vilas
portuguesas, principalmente São Paulo. Compôs o Poema à Virgem, de
4172 versos, enquanto estava no cativeiro dos tamoios e diz a lenda
que o havia escrito na areia da praia.
Graças à sua memória excepcional, mais tarde, o poema foi transcrito
para o papel.
Considerado o primeiro dramaturgo, o primeiro gramático e o primeiro
poeta nascido nas Ilhas Canárias. Também é um dos primeiros autores
da literatura brasileira. Compôs inúmeras peças teatrais e poemas de
teor religioso e uma epopéia.
Foi historiador e "jornalista", que noticiava a seus superiores os
principais acontecimentos no início da colonização de São Paulo.
Escreveu a primeira gramática sobre uma língua do tronco tupi: a
"Arte da Gramática da Língua Mais Falada na Costa do Brasil", que
foi publicada em Coimbra em 1595.
A ele se deve o registro da fundação de São Paulo.
Em carta a seus superiores da Companhia de Jesus, diz:
“A 25 de Janeiro do Ano do Senhor de1554, celebramos, em paupérrima
e estreitíssima casinha, a primeira missa, no dia da conversão do
Apóstolo São Paulo, e, por isso, a ele dedicamos nossa casa!"
Faleceu em 1597 aos 63 anos de idade. |
Quase unanimidade dos paulistas e paulistanos acha que o padre José de
Anchieta fundou São Paulo.
Mas, o próprio Padre Anchieta entendia diferente, quando escreve que “João
Ramalho era fundador e conservador da Casa de Piratininga" (peixe seco, nome
indígena da região, onde se encontra a cidade de S. Paulo).
Ainda se discute quem foi o fundador de São Paulo. Para alguns, o correto
seria considerar João Ramalho o fundador de São Paulo.
A tese de que João Ramalho foi realmente o principal fundador de São Paulo
poderia ser aceita se entendermos que, se não houvesse a instalação do
Colégio em 1554, com certeza, esta comunidade, miscigenada de brancos e
índios (principalmente descendes de João Ramalho), iria crescer,
provavelmente mais lenta.
Mais cedo ou mais tarde, surgiria algum marco histórico, um outro bem
público de uso da comunidade, que poderia ser uma igreja, uma escola ou
mesmo uma praça pública.
Na realidade, trata-se de uma discussão inócua, porque a fundação de uma
comunidade dificilmente depende de uma só pessoa, mas de diversos fatores,
que envolvem a participação de mais pessoas.
O padre Manoel da Nóbrega, por exemplo, tinha certa prática em inaugurar
escola, colégios, para catequizar índios, pois já havia fundado colégio em
Salvador e deve ser considerado o fundador do colégio em São Paulo, muito
embora um colégio não seja uma cidade.
No caso de São Paulo, porém, é o principal marco histórico do nascimento de
São Paulo.
Se tivesse que definir quem foi o principal responsável pela fundação de São
Paulo, diria que participaram da fundação de São Paulo e de sua
consolidação: padre Manoel da Nóbrega, João Ramalho, cacique Tibiriçá e
também o padre José de Anchieta.
Anchieta colaborou com a decisão da instalação do Colégio, que marcou o
nascimento de São Paulo. Sua coragem e empenho foram fundamentais na luta
para preservar o início de São Paulo, quando se ofereceu, como refém à
Confederação dos Tamoios (28) em Iperoig.
(28)
Confederação dos Tamoios:
Por volta de 1555, cansados de serem atacados e escravizados pelos
portugueses, principalmente por João Ramalho e seus descendentes, os
tamoios declararam guerra aos portugueses e aos tupiniquins de São
Paulo.
Os tamoios
pertenciam à nação tupinambá, que ocupava o litoral brasileiro entre
Bertioga, Cabo Frio e também havia tribos tupinambás, situadas ao
longo do Vale do Paraíba.
O cacique Aimberê liderou a revolta com muito ódio e sede de
vingança, porque seu pai fora aprisionado por João Ramalho e
Tibiriçá e morrera no cativeiro em São Paulo em condições subumanas.
Para se fortalecer, Aimberê conseguiu unir os caciques tupinambás,
inclusive Cunhambebe, de Angra dos Reis, e obteve apoio das tribos
goitacás e aimorés.
Os franceses apoiaram a Confederação, pois tinham o objetivo de
colonizar territórios ocupados por Portugal e pelos Tupis. Aimberê
se valeu do sobrinho de Tibiriçá, Jaguaranho, para se reunir com
Tibiriçá na tentativa de conseguir o apoio do sogro de João Ramalho
no combate aos portugueses.
Tibiriçá evidentemente não aceitou, já que João Ramalho fazia parte
de sua família.
Fingiu,
porém, que estava de acordo.
Quando os
tamoios chegaram perto de São Paulo, foram surpreendidos e dizimados
pelos portugueses, que tinham sido informados do ataque por
Tibiriçá, que, inclusive, matou seu próprio sobrinho.
Apesar do armistício de Iperoig, em 1563, os combates continuaram.
O conflito se encerrou, somente em 1567, quando o governador Mem de
Sá conseguiu derrotar os franceses e os tamoios, com a ajuda de seu
sobrinho Estácio de Sá, que morreu de uma flechada durante a luta. |
Anchieta permaneceu prisioneiro dos tamoios, durante cinco meses, até que o
acordo com os portugueses e tupiniquins fosse concluído, com a anuência
também de João Ramalho e do cacique Tibiriçá.
Portanto, participaram ativamente da fundação de São Paulo: o padre Manoel
da Nóbrega, João Ramalho, o cacique Tibiriçá, o padre José de Anchieta e os
demais padres, que faziam parte da missão jesuítica.
Enfim, se confirma a máxima de que: “Ninguém faz sucesso sozinho”.
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